Por Carlos Franco
Geraido Júnior, 59 anos, sonha todas as noites com sua bike e seus equipamentos de ciclista. A foto com a qual se apresenta nas redes sociais lá pelas bandas do sertão do Seridó, no Rio Grande Norte, é da bike que teve de vender para pagar os exames exigidos aos vigilantes para seguirem no trabalho. Entre o lazer e o prazer, Geraido teve que optar pelo trabalho. É a regra da sobrevivência. Mas hoje, sem a bike e os equipamentos que vendeu “a preço de banana” por pura necessidade, sente falta da vida que teve e da saúde e disposição que a bicicleta, em troca de suas pedaladas, lhe dava.
“A bicicleta faz um bem danado, pois eu me mantinha em forma e prevenia diferenças doenças, mas não tive muita escolha”, relata sem esconder sua tristeza. Pai de três filhos, Geraido, assim mesmo, com “i” em fez do “l”, tem orgulho de ter um neto, com outro a caminho.
Morando e cuidando da mãe na pequena cidade de São João do Sabugi, no Rio Grande do Norte, onde o rio Sabugi faz a curva, ele sonha todas as noites com as pedaladas em uma bike que, além da sensação de liberdade, lhe oferecia a disposição necessária para o trabalho e também como seu veículo preferido de transporte.
Desempregado, como muitos que foram atingidos pela pandemia Covid-19, ele pensa, em breve, voltar à ativa, no momento busca oportunidades e, é claro, em troca delas a possibilidade de voltar a ter um bike, “que nem precisa ser de luxo, pode ser de segunda mão mesmo”.
O homem que deixou a pequena cidade de 6 mil habitantes do sertão do Seridó já fez de tudo na vida e, como muitos de seus conterrâneos, partiu um dia para São Paulo, carregando pouco dinheiro e muitos sonhos. Trabalhou de peão em obras enquanto a mãe exercia a função de “piniqueira”, como são conhecidas as diaristas e faxineiras no sertão.
A expressão piniqueira foi herdada dos tempos coloniais e se referia a lavar os penicos, isto é, fazer a faxina de uma casa nos dois ambientes que exigem estarem sempre limpos: cozinha e banheiros. Estes últimos escassos, muitas vezes uma casinha fora da casa, que exigia o uso dos penicos dentro dos quartos e sua limpeza diária, daí a importância das piniqueiras para a saúde dos lares.
Contando moedas, somando o que ganha com a aposentadoria da mãe, Geraido hoje se preocupa com a situação da pequena cidade, onde o coronavírus também fez morada e vítimas. “É uma cidade pequena, o vírus podia ser evitado”, diz ele que usa máscara para sua proteção e dos que ama, como sua mãe. E também lava com água e sabão aos mãos, evitando tocar na boca e nos olhos.
Geraido se cuida para realizar novamente o sonho de ter um bike que comprou, no passado, com os frutos do seu trabalho. E espera, quem sabe, pelo dia que possa sair por São João do Sabugi pedalando e recomprando ou ganhando de alguma boa alma, quem sabe um dos nossos leitores sobretudo os fabricantes ou vendedores de bicicletas, aquilo que, por necessidade, vendeu um a um.